Polícia detém intruso em flagrante


A polícia dinamarquesa apanhou em flagrante um homem somali a tentar entrar na casa do cartoonista Kurt Westergaard, autor de algumas das caricaturas satíricas de Maomé que enfureceram o mundo muçulmano em 2006. O suspeito foi já esta tarde levado a tribunal e contra ele deduzidas acusações de tentativa de homicídio, que negou.

O intruso, armado de uma faca e de um machado, foi alvejado numa perna e numa mão pelos agentes depois de tentar agredir um deles e ficou desde então, noite avançada de sexta-feira, detido para interrogatório. Foi identificado, pelos serviços de segurança e espionagem dinamarqueses (PET), apenas como um indivíduo de 28 anos, que detinha autorização de residência na Dinamarca, e que tem “laços próximos com a organização terrorista somali Al-Shabab assim como a líderes da Al-Qaeda no Este africano".

A sua identidade permanece resguardada por ordem do tribunal, onde lhe foram deduzidas duas acusações de tentativa de homicídio: do cartoonista e também do polícia a quem o somali atirou com o machado ao tentar escapar-se no local à detenção. Segundo a polícia dinamarquesa, o intruso gritou “num mau inglês” que queria matar Westergaard.

O juiz decretou ainda que o suspeito – o qual compareceu em tribunal levado numa maca, com um braço e uma perna engessados, e também com um pano a cobrir-lhe a cabeça – irá ficar em detenção provisória pelas próximas quatro semanas, duas das quais em isolamento, para permitir uma mais detalhada investigação antes do julgamento, cuja audiência preliminar foi marcada para 27 de Janeiro.

Westergaard, que não ficou ferido no incidente, refugiara-se aos primeiros sinais da intrusão num quarto seguro da casa, enquanto a neta, de cinco anos, permaneceu na sala de estar da residência, em Aarhus, a segunda maior cidade da Dinamarca. Foi do quarto seguro que, pelas 22h00 locais (21h00 em Portugal), o cartoonista accionou o alerta para as autoridades. "Fechei-me e alertei a polícia. Ele tentou partir a porta de entrada [da casa] com um machado mas sem sucesso. Ouvi-o a gritar insultos, não me lembro exactamente o quê mas recordo que eram insultos. Ele falava num dinamarquês muito mau e disse que havia de voltar", contou o caricaturista à agência noticiosa local Ritzau.

O caricaturista foi entretanto levado para um local seguro pela polícia, mas deixou já claro que pretende regressar a casa quanto antes.

“Ao recebermos a mensagem, dirigimo-nos para o endereço [de Westergaard] com muitos agentes. Quando vimos o suspeito ele estava a afastar-se do local. E então atacou um polícia com um machado e fê-lo com tal perícia que os agentes tiveram de disparar contra ele”, relatou o sub-superintendente da polícia de Aarhus, Fritz Keldsen, à BBC.

Os PET indicaram que o somali está envolvido com uma “rede terrorista” que há muito tempo se encontra sob investigação por ameaças feitas contra o cartoonista. “Olhamos para este caso com muita seriedade”, avaliou o chefe dos PET, Jakob Scharf, no comunicado divulgado de manhã.

Casa fortificada
Westergaard, de 74 anos, é o ilustrador que fez o cartoon de Maomé com uma bomba no turbante. O seu desenho, a par de 11 outros satirizando o profeta muçulmano e associando-o ao terrorismo, foi publicado inicialmente pelo diário dinamarquês "Jyllands-Posten" em Setembro de 2005; mas só meses mais tarde, depois de serem reproduzidos pela revista norueguesa "Magazinet", já em Janeiro de 2006, deram azo a uma vaga de manifestações por todo o mundo islâmico e a boicotes aos produtos oriundos daqueles dois países europeus.

Apesar de o jornal dinamarquês ter entretanto apresentado desculpas públicas pela publicação das caricaturas, o caso agudizou-se profundamente um mês mais tarde quando as mesmas foram reproduzidas também pelo tablóide francês "France Soir". Nos dias e semanas seguintes o mesmo aconteceu, senão na íntegra pelo menos de parte dos doze cartoons, em inúmeros outros jornais por toda a Europa.

Os protestos multiplicaram-se então no mundo muçulmano, na Indonésia, Gaza, Cisjordânia, Afeganistão, Irão e Iraque, com as embaixadas e outras representações oficiais de muitos países a serem alvo de ataques pelos manifestantes, incendiadas e apedrejadas, e chegaram mesmo a muitas capitais europeias, numa espiral de cada vez maior violência que se saldou pela morte de pelo menos 50 pessoas.

A polícia dinamarquesa está agora a investigar se o intruso somali agiu sozinho nesta tentativa de entrada na casa de Westergaard, a qual se tornou numa verdadeira fortificação desde que o cartoonista, há cerca de um ano, resolveu deixar de se esconder, devido às ameaças de morte de que é alvo, e tentar viver “uma vida normal”. É publicamente conhecido que a sua casa em Aarhus está sob apertada vigilância e forte aparato de segurança.

Vários jovens muçulmanos foram condenados na Dinamarca nestes últimos quase quatro anos por planearem ataques à bomba, segundo a polícia em parte em protesto à publicação dos cartoons. O líder da Al-Qaeda, Osama bin Laden, afirmou em 2008 que toda a Europa devia ser “castigada” por causa das caricaturas que enfureceram o mundo muçulmano, onde o simples retratar de Maomé é já por si considerado um acto ofensivo.




Fonte: Público

POSTED BY Joana Vieira
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