Novos partidos que querem chegar à AR


“Três, acredito que vamos eleger três deputados.” José Augusto dos Santos, professor reformado, tem uma T-shirt onde se lê “Construir Portugal – um desafio para todos” e com a declaração que acaba de fazer ao P2 encarna completamente o espírito do Movimento Esperança Portugal (MEP). Ao seu lado, Maria da Encarnação, também professora reformada, T-shirt igual, acena com a cabeça, concordando: “Três.”

O optimismo e o espírito positivo são imagens de marca do novo partido, criado por Rui Marques, antigo alto-comissário para a Imigração e Minorias Étnicas. Mas é o próprio que reconhece que a eleição de três deputados “é a versão mais optimista”. A “expectativa realista” é que o MEP entre na Assembleia da República (AR) e um deputado é uma “grande probabilidade”.

Em breve, nesta manhã de domingo, dia 20, as T-shirts iguais às de José Augusto e Maria da Encarnação – há em verde, azul, vermelho e amarelo – vão multiplicar-se em frente ao Padrão dos Descobrimentos, em Belém, Lisboa, e centenas de apoiantes do MEP vão transformar-se na metáfora do que querem fazer: com peças gigantes de um puzzle vão construir um mapa de Portugal no chão.

“A ideia”, explica Margarida Neto, médica psiquiátrica e vice-presidente do partido, “é isto ser um jogo em que cada um tem que estar atento à peça do lado e construir ajudando os outros. Esta é a mensagem que queremos levar ao Parlamento.” Margarida transborda de entusiasmo. “Andei a distribuir propaganda pelas caixas de correio, e houve um senhor que estava a pôr publicidade e que me ensinou a forma mais rápida de o fazer. Disse-me: ‘Faça assim, senão não saímos daqui, nem a senhora nem eu’.”

O partido, encorajado pelos 55 mil votos conseguidos nas europeias (a candidata foi a jornalista Laurinda Alves), não poupa esforços. Todos fazem tudo, cada acção de rua é fundamental, cada contacto pode significar um voto. Na sexta-feira anterior, no Cais do Sodré, Margarida Cabral, advogada (e que é, com Rui Marques e Margarida Neto, uma dos três principais candidatos a Lisboa), distribuía propaganda e apresentava-se, com um grande sorriso: “Olá, sou Margarida Cabral, sou candidata.”

Atrair os abstencionistas

Para os “pequenos”, é assim. O próprio Rui Marques confessa que “a esmagadora maioria” das pessoas não o reconhece. Mas nada abala o entusiasmo. “Se tivermos assento parlamentar, tudo vai ser diferente: passamos a ter voz parlamentar, o que significa voz mediática, financiamento público [a campanha está a ser paga com donativos dos membros e um empréstimo bancário de 200 mil euros], e sobretudo a poder provar no dia-a-dia o que é a política da esperança.”

Domingo de manhã o hino do MEP espalha-se por Belém: “Melhor é possível, acredita...”. Os grupos com T-shirts de várias cores começam a organizar-se, segurando bandeiras verdes. Passam turistas que lançam olhares curiosos. “Pensa abster-se? Está farto da velha política?”, diz uma voz através dos altifalantes.

Atrair os abstencionistas e os que votaram em branco é um objectivo declarado. “Temos muita gente que vem da abstenção, do voto em branco, desiludidos com a política e que com o MEP regressam ao voto”, garante Rui Marques. “Mas também há gente que vem do PS, que já votou PSD, ou CDS, e até, para nossa surpresa, gente que já votou Bloco de Esquerda” (o Bloco está “nos antípodas” do MEP, mas a ascensão de pequeno partido a terceira força política serve de inspiração).

A mensagem chegou já a pessoas como José Augusto e Maria da Encarnação, os dois professores reformados que aderiram ao MEP porque “num momento em que a política e os políticos estão tão desacreditados é preciso dar confiança a quem merece confiança” e promete “fazer uma política que não seja só destruir e atacar”.

Para outra geração, mais jovem, os argumentos não são muito diferentes. Sofia Lousada tem 23 anos e não se interessava por política. Como é que aparece agora na lista do MEP? “Foi por achar que esta era uma política diferente”, diz, com um sorriso tímido. “Às vezes os políticos enrolam e não dá nada. Esta é uma política mais objectiva, centrada nas pessoas, positiva. É idealista, mas concreta.”

O hino continua a tocar, os militantes estão mobilizados. “Dentro de cinco minutos vamos começar a construir Portugal”, anuncia a voz no altifalante. Como formigas, os membros dos vários grupos lançam-se, atarefados, na construção do puzzle. “Não se juntem tanto ao meio”, avisa a voz – e não se leia nisto qualquer mensagem política, porque o MEP é precisamente “um partido do centro”. Aliás, é “o” partido do centro. “Em Portugal não havia partidos do centro até nós chegarmos”, diz Rui Marques. E isso o que significa? Acreditar na sociedade civil, diz, “confiar nas pessoas”, dar-lhes autonomia. Um esclarecimento: há católicos no MEP (Rui Marques, por exemplo), mas o partido “leva muito a sério a separação entre a esfera religiosa e a política”. A convicção religiosa “é um assunto privado, de cada um”.

“Portugal já está a tomar forma”, anuncia a voz. O centro do puzzle já é visível. Uma turista japonesa tira fotografias. Rui Marques explica-nos o que é isso de uma política idealista mas concreta. “O meu trajecto de vida não é só o de um idealista. Tive a sorte de construir a [revista] Cais, para os sem-abrigo; desenvolvi a política de integração de imigrantes. Acha que o caminho que fizemos ao longo deste ano e meio é fácil? É um caminho só de idealistas? Para ser utópico é preciso ser pragmático”.

Cheque-emprego

Um exemplo de uma das “160 medidas, todas quantificadas” do programa do MEP: o cheque-emprego. A proposta é pôr os desempregados de longa duração a trabalhar em instituições de solidariedade social, com o salário mínimo, o que lhes permitira regressar à vida activa. Para isso são necessárias receitas que podem vir, por exemplo, das Scuts, que o MEP defende que sejam pagas. “O Estado tem um papel fundamental a cumprir nesta altura – e aí estamos a quilómetros dos liberais.”

Construído Portugal, com a colaboração de todos (apesar de pouco depois ter tido que regressar à sua condição de conjunto de peças de um puzzle), a campanha segue caminho. Voltamos a encontrar-nos à noite, junto à Sé de Lisboa, num restaurante italiano de um imigrante nepalês que obteve há pouco tempo a nacionalidade portuguesa.

À volta da mesa estão membros das associações de imigrantes com os quais Rui Marques trabalhou nos tempos do Alto Comissariado. E está Anabela Rodrigues, a Belinha. Tem 32 anos, é descendente de cabo-verdianos, vem da Cova da Moura, e faz parte da direcção do MEP e das listas de candidatos. Esta jurista ainda não se habituou a ver a sua cara nos cartazes, mas não tem dúvidas de que “é importante que haja uma cara da imigração”.

Risonha, despachada, explica que recusou um primeiro convite de Rui Marques para o Alto Comissariado, mas quando ele insistiu com novo convite, desta vez para a direcção do MEP, achou que tinha “chegado a hora”. Sabia que os imigrantes são ignorados e não têm voz, mas não imaginava “que a vida fosse tão dura” para um pequeno partido. Quando Obama foi eleito, ela, em plena convenção do MEP, olhou em volta e constatou: “Sou a única preta na sala.” Dá uma gargalhada: “Pensei: ‘Eh, pá, isto é uma responsabilidade muito grande’”.

Mas está ali, disposta a assumi-la. Estão ali todos. Optimistas, cheios de boas intenções. Rui Marques já ouviu essa “crítica” várias vezes. “É verdade, confirmo, temos boas intenções. Preferia que tivéssemos más?”


Fonte: Público

POSTED BY Joana Vieira
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