O fim das taxas moderadoras
Depois de ter chumbado a revogação das polémicas taxas moderadoras no internamento e na cirurgia de ambulatório no início deste ano, o Executivo prepara-se agora para suprimir estes pagamentos. Governo evita assim uma "frente de ataque" da oposição na Assembleia da República
O Governo vai acabar com as taxas moderadoras no internamento e na cirurgia de ambulatório no Orçamento de Estado para 2010. Depois de ter chumbado, no início deste ano, propostas de toda a oposição para revogar estes pagamentos - tendo então remetido a questão para a legislatura seguinte - o Executivo evita agora uma "frente de ataque" das várias bancadas parlamentares, numa matéria que reúne o consenso entre os partidos da oposição.
O DN soube, junto de fontes do Governo, que a medida vai ser contemplada no Orçamento de Estado, actualmente em preparação. O que permite ao Executivo adiantar-se a qualquer iniciativa parlamentar - isto porque a revogação das duas taxas, tendo implicações a nível orçamental, nunca poderá entrar em vigor no ano corrente, mas apenas com a aprovação das contas públicas para o próximo ano. As taxas moderadoras para a cirurgia de ambulatório a para internamento (taxa de utilização por dia de internamento nos dez primeiros dias) são, actualmente, de 5,20 euros.
As duas taxas foram criadas em 2007 pelo antigo ministro da Saúde Correia de Campos, com o argumento de que seriam um instrumento de moderação no acesso dos utentes aos cuidados médicos do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Causaram de imediato duras críticas, não só na oposição, mas até mesmo entre os socialistas. Na votação do OE de 2007, Manuel Alegre entregou uma declaração de voto criticando a medida. "Discordo profundamente das taxas moderadoras para internamentos e cirurgias, as quais, segundo o ministro, não representam mais do que 1% dos gastos do Serviço Nacional de Saúde", escreveu o então deputado socialista, qualificando a iniciativa de Correia de Campos como "uma dupla tributação que contraria frontalmente a filosofia do SNS". "A existência destas taxas moderadoras pode ser um primeiro passo na alteração dos princípios fundamentais do SNS", sublinhou Manuel Alegre.
Na oposição, os argumentos do ministro também não colheram simpatia. Sobretudo por se tratar de internamentos e cirurgias, dois cuidados médicos que não dependem do doente, mas da decisão do médico. Logo, invocaram todas as bancadas, do CDS ao Bloco de Esquerda, não se pode falar de uma medida pedagógica para evitar abusos no acesso aos serviços do SNS. O próprio Correia de Campos, num livro publicado em 2008, viria a usar uma argumentação bem diferente da inicial, referindo que a criação das duas taxas visou preparar a "opinião pública para a eventualidade de todo o sistema de financiamento [do SNS] ter de ser alterado". Manuel Alegre viria a dar expressão às críticas no início deste ano quando, a par de mais quatro deputados da bancada do PS, se juntou à oposição no voto favorável a um diploma do Bloco de Esquerda que propunha a revogação das duas taxas, abstendo-se na votação das propostas do PSD, CDS e PCP.
Então com maioria absoluta na Assembleia da República, o PS vetou todos os projectos - uma situação que não se repetiria actualmente face à maioria relativa no Parlamento. Um chumbo que também não agradou ao histórico socialista e fundador do SNS António Arnaut, que chegou a dirigir um apelo aos deputados do PS para quebrarem a disciplina partidária e votarem a revogação.
Pela voz do então vice-presidente da bancada José Junqueiro, o PS deixou então a promessa de rever estes pagamentos na legislatura seguinte (a actual). Uma intenção que não foi transposta para o programa eleitoral. Já a oposição deu mostras de que o assunto não ficaria na gaveta: o Bloco de Esquerda já anunciou a apresentação, na AR, de um projecto de lei para revogar as duas taxas moderadoras.
Fonte: DN