18.11.2011 - A Voz Humana - Teatro Nacional São João, Porto


--- A Voz Humana ---

Teatro Nacional São João, Porto (18.11.2011)
Texto: Ariana Ferreira


A ruptura em interrupção de A Voz Humana em cena no Teatro Nacional São João

A Voz Humana de Jean Cocteau, numa encenação de Carlos Pimenta interpretada por Emília Silvestre, estreou na passada sexta-feira, no Teatro Nacional São João, onde se manterá em cena até 4 de Dezembro.

Da crítica de que na obra de Jean Cocteau os protagonistas eram relativizados face ao papel do dramaturgo e à própria encenação, nasceu, como resposta, A Voz Humana. Monologo no feminino, pensado para uma cenografia mininal de modo a que atenção se focasse no trabalho de acrtiz, constrói-se particularmente a uma só uma presença mas, sobretudo, pela via da ausência.

Uma mulher, recém deixada pelo amante, tem com ele uma última conversa por telefone. Por entre constrangimentos pessoais e técnicos, por entre ruídos e interrupções, debate-se, para que seja ouvida, à medida em que a narrativa e as personagens, invisíveis e inaudíveis com excepção da protagonista, são reveladas pelas falas desta e edificadas pelos silêncios, do outro lado da linha, que cabem ao espectador interpretar e preencher.

Caído o pano, o cenário, circunspecto por um traçado de luz a delimitar o espaço no palco, acentua o confinamento da peça àquele momento e àquela sala/quarto onde figuram apenas uma cama, uma cadeira e o telefone, convertido em auricular nesta adaptação, num reflexo da constante evolução dos objectos de mediação. Para além de mediador entre esta mulher e o ex-amante, o telefone actua como óbvio desencadeador da acção, bem como força motriz da própria personagem. É o que os une e, ao mesmo tempo, um marco da distância instaurada.

Nesta visão de Carlos Pimenta, o ruído e os contratempos que obstam à comunicação, sob a forma dos problemas na ligação, são enaltecidos pelos trabalhos de sonoplastia, em concordância com as distorções no ecrã integrado no cenário. É exibido um vídeo a preto e branco, onde se sucedem paisagens quotidianas e urbanas, e que há-de funcionar também como ruído, dividindo a atenção do público. Pequenos apontamentos musicais, concebidos pelos Dead Combo, evidenciam e atenuam os estados emocionais da personagem.

Numa época em que a comunicação é mediada em permanência, e em que a impossibilidade dessa permanência raramente constitui hipótese, A Voz Humana não deixa de funcionar como uma chamada de atenção para o modo como as pessoas processam as relações e comunicam entre si, tal como pode ver-se nesta adaptação sofisticada, adequada as potencialidades cénicas actuais.

Agradecimentos:
TNSJ

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